Por Pe. João Gomes aa
O ser humano moderno vive num mundo voltado inteiramente para aquilo que se encontra fora de si. Seduzido pelas propostas mercadológicas e midiáticas, ele mergulha facilmente no turbilhão dos afazeres e na luta contra o tempo, tornando-se, não raras vezes, escravo dos seus aspectos mais baixos: ganância, egoísmo, violência, vingança, competição… Neste contexto, a dialética da interioridade agostiniana constitui um método fundamental para responder às inquietações pertinentes a cada pessoa humana.
Santo Agostinho (354-430) é considerado um dos mais destacados Padres da Igreja e a veracidade desta afirmação é sua própria vida, seja considerando a história de sua conversão pessoal à fé cristã ou o serviço que ofereceu à Igreja como Bispo de Hipona durante trinta e quatro anos, tempo em que escreveu copiosamente, combateu heresias e viveu em comunidade com outros cristãos. Dos seus 232 livros, além de inúmeros tratados, sermões e cartas, As Confissões é uma obra fascinante por mostrar a alma inquieta de Agostinho em busca da verdade definitiva, absoluta, que satisfaça sua sede de saber, de crer, de ser amado.
Aos dias atuais a espiritualidade agostiniana constitui uma fonte de águas refrescantes, que alivia a fatiga do ser humano no seu esforço incansável pela busca da felicidade, tantas vezes, por caminhos curvados e superficiais, e aponta para a verdadeira fonte capaz de saciar toda e qualquer sede: “Fizestes-nos Senhor para vós, e inquieto está o nosso coração enquanto não repousar em vós” (Confissões 1,1).
Para Agostinho o caminho que leva a pessoa humana à quietude e ao encontro com Deus é o retorno à interioridade. A interioridade é o recolhimento dentro de si, que faz a pessoa encontrar Deus pelo autoconhecimento: “Que eu me conheça e te conheça, Senhor!” (Solilóquios 2,1). Uma vez mergulhando no seu universo interior, a pessoa é desafiada a ordenar o seu amor, pois somente “quando estão em sua devida ordem, as coisas descansam” (Confissões 13, 9,16). O amor desordenado provoca a confusão ou caos interior. Orientado para Deus, dá identidade à pessoa e promove a comunhão fraterna. Por isso diz Agostinho: “Ame, e faça o que quiseres”… (Tratado sobre a primeira carta de João 7, 8)
Em tempos de grandes e rápidas transformações, quando o mercado explora o desejo humano, move e seduz o homem para a exterioridade, diluindo o sentido da vida e fragmentando a sua identidade, o cultivo da interioridade, fazendo do amor a verdade que preside as relações e contribui para uma sociedade justa e solidária, poderá configurar-se como uma resposta altamente significativa e iluminadora para os homens e mulheres da atualidade.
Pe. JOÃO GOMES é religioso Assuncionista