Evocar a alma do Pe. d’Alzon é evocar toda sua pessoa.

Muitas biografas tratam de suas virtudes à parte como se o natural e o sobrenatural não caminhassem juntos e como se este último sublimasse o primeiro. Isso é duplamente verdadeiro para o Pe. d’Alzon, cuja calorosa humanidade marca em tudo com o seu selo esse grande homem espiritual. Ele mesmo escreveu: “A gente só é o que é com a própria natureza. É preciso divinizá-la, sem dúvida, porém destruí-la é pôr nada ali onde Deus quis fazer a obra-prima da criação”.

Durante toda a sua vida realizou essa fórmula, com liberdade e plenitude extraordinárias; realizou-se sem se destruir e sem se deformar. O que mais elevou de si ao sobrenatural são as mais fortes de suas qualidades; suas virtudes fundamentais correspondem às características mais elevadas de seu ser moral; assim, seu ascetismo e sua mortifcação rigorosa correspondem à sua extraordinária energia; seu zelo apostólico ao seu entusiasmo; o estilo de sua piedade ao vigor de seu temperamento.

Daí provém, em grande parte, a impressão de riqueza e de superabundância que emana de sua pessoa e de sua vida. Nos passos sobrenaturais do religioso e do apóstolo, nas próprias palavras do homem meditativo, a personalidade robusta do Pe. d’Alzon aflora por todos os seus poros, de modo que sempre podemos encontrá-lo íntegro. Igualmente, quando se entrega aos passatempos da amizade, com seu riso sonoro, suas brincadeiras astutas e mordazes e seu belo entusiasmo, sua alma, repleta de Jesus Cristo, irrompe como um torvelinho, proclamando as grandes exigências do cristianismo, com as quais ele não transige nunca.

É a um só tempo simples e complexo. Simples por sua retidão e sua franqueza que não se combinam com rodeios, manipulações nem com subterfúgios de nenhum tipo; pode-se até dizer que, no bom sentido da palavra, é simples até o ponto da ingenuidade. Complexo pelos contrastes surpreendentes do seu temperamento, possuía grande amplidão de espírito. Desta – e também por antítese da estreiteza de espírito – nos deixou uma excelente definição, na qual vemos como que traçando seu próprio retrato: “A mente ampla se dedica a ver as coisas em si mesmas; a mente estreita as enxerga em relação a si própria … A mente ampla entrega-se a uma causa; a mente estreita entrega-se a si mesma em uma causa qualquer; a mente ampla se esforça para sobrevoar os cumes, enquanto o espírito estreito cava buracos de toupeira e está contente de proteger-se dentro deles; pois a meta essencial da mente é não se comprometer, chama isto de prudência… A mente ampla de nada serve sem um caráter forte e generoso, pois ela vê o que é preciso fazer, mas não faz nada. A mente estreita com um caráter enérgico faz mais mal do que bem; no máximo muito barulho para nada… A mente ampla implica certa desconfiança, pois enxergando longe entende que poderia ver ainda mais longe. A mente estreita está tão à vontade sob a tampa da panela que o fundo da panela não lhe interessa. Golpeia a cabeça com a tampa e diz: Vocês sabem que não existe nada além. Feliz mortal aquele que pensa que a tampa da panela é a abóbada celeste.”

Em Pe. d’Alzon a intolerância aplicava-se às ideias, nunca às pessoas; nele esta intolerância não chocava, pois se percebia que era fruto de seu amor a Jesus Cristo e à sua verdade e porque suas convicções mais irredutíveis eram levadas com amplidão de vistas.

(do livro “Emanuel D´Alzon- um promotor do renascimento católico”, de Gaétan Bernoville.)

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