A publicação integral das cartas do Pe. d’Alzon, recheada de notas históricas e explicativas de grande valor, é uma ferramenta de primeira mão para descobrir a rica personalidade do fundador dos Agostinianos e das Oblatas da Assunção.

Pe. Georges Tavard soube utilizar esta correspondência para revelar-nos um aspecto pouco conhecido do Pe. d’Alzon em plena atividade nos bastidores do Vaticano I, esse Concílio que o empolgava particularmente.

Residindo em Roma, ele o acompanhou de ponta a ponta durante dez meses, lamentando os meandros de um curso julgado longo demais, engajando-se em controvérsias, sem, no entanto, participar das sessões públicas, ao contrário do Pe. Galabert¹, que a elas tinha acesso.

O catolicismo liberal, acusado de comprometimento com a Revolução e o Galicanismo², minava as prerrogativas do Papa em favor de supostos direitos da Igreja local, sendo objeto de reprovação sem apelo.

“Tratar os romanos e os galicanos do mesmo modo é impossível”, afirma ele em 25 de fevereiro de 1870. “Nós somos a verdade, eles são o erro e, em breve, a heresia.” (…) “A conciliação é doravante impossível: a minoria foi rancorosa demais, insolente demais, e de urna demasiada má fé”, escreve aos 2 de junho de 1870.

Impetuoso, Pe. d’Alzon não tolera que a verdade, clara para ele, não seja reconhecida nem que o Papa seja criticado, mesmo indiretamente, pelo viés da liberdade do Concílio. A verdade se impõe por si mesma. Ela é tão evidente! Foi sempre esse o pensamento do Pe. d’Alzon.

A proclamação da infalibilidade do Papa que, para o Pe. d’Alzon não se limita às declarações mais solenes, é duplamente necessária. É o penhor do renovamento profundo da Igreja que passa por uma autoridade maior do Papa sobre a totalidade da Igreja, permitindo-lhe levar a cabo as reformas indispensáveis. Declarado infalível, o Papa aparecerá mais ainda como afiançador da verdade cujo depósito foi confiado por Deus à Igreja. Toda ordem sobrenatural, que os erros do tempo se esforçam em solapar, achar-se-á consolidada: “O Concilio se propõe antes de tudo a restabelecer a ordem sobrenatural trazida por Nono Senhor sobre a terra e atacada pela incredulidade, o naturalismo, o racionalismo e o socialismo.

O remédio para a crise da Igreja na sociedade pós-revolucionária é a infalibilidade.

E o elemento humano do Concílio que é relatado “frequentemente com humor; às vezes com irritação” numa boa parte da correspondência do Pe. d’Alzon. Essa correspondência não é a de uma testemunha serena, mas, sim a de uma testemunha lúcida sobre todas as limitações dos homens e as falhas de uma organização. Também é a de um partidário engajado em nome mesmo das suas convicções mais caras. Mesmo quando o dardo lançado contra o adversário é certeiro, não é a vantagem pessoal que Pe. d’Alzon está procurando, e sim o triunfo da Igreja a serviço do Reino de Deus.

Seu amor profundo pela Igreja e seu desprendimento foram inegáveis. Nunca esqueçamos isso.

POR RELIGIOSOS DA ASSUNÇÃO, CASA GENERALÍCIA (ROMA), Pe. Claude Maréchal, Superior-geral. (1996)

1. Victorin Galabert, convertido por um sermão do padre (uma palavra banal no confessionário acabou por decidi-lo), chega aos 23 anos; em 1853, como professor e médico do Colégio. Inscreve-se na Ordem Terceira, conclui o doutorado em medicina em 1854 e entra no noviciado no dia seguinte. (N.E.)

2. GALICANISMO movimento originado na França, que defendia a independência administrativa da Igreja católica romana de cada país com relação ao controle papal. (N.E.)

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