Tal como acontece com algumas plantas bonitas, ideias e crenças muitas vezes florescem mais gloriosamente depois que pareciam ter morrido. Foi assim com a ideia cristã do reinado social do Cristo Rei. Enquanto estava vivendo saudavelmente na mente da maioria dos homens – enquanto não havia nenhum governo em qualquer lugar no ocidente que não fosse governo cristão, geralmente com um príncipe chefiando – isso era mais ou menos garantido. Não havia nenhuma necessidade real para formulá-la de forma detalhada. A situação tornou-se diferente – a ideia parecia ter morrido – quando os homens começaram a governar a sociedade de acordo com sua própria vontade, em vez da vontade de Deus, e começaram, no processo, destronando os príncipes por Ele designados para servir como governantes. Isso foi no século XVIII.
No século XIX, a ideia do governo com Cristo sendo o supremo Governante da Sociedade teve um enorme florescimento e em nenhum lugar mais do que na França, a própria terra onde a derrubada do governo cristão começou em 1789. Iniciando em 1809, quando Joseph de Maistre escreveu seu Ensaio sobre o Princípio Gerador de Constituições Políticas e Outras Instituições Humanas, nem uma década do século XIX na França ficou sem defensores de um governo cristão. Além de Maistre, incluem-se Louis de Bonald, François René de Chateaubriand, Louis Veuillot, Dom Prosper Guéranger, Edouard Cardeal Pie e, menos conhecido hoje, embora a Igreja tenha reconhecido sua santidade, declarando-o Venerável, o Pe. Emmanuel Joseph Marie Maurice d’Alzon.
Em 1925, apesar dos esforços de seus defensores franceses, a ideia de Cristo como Governante da Sociedade foi tão amplamente ignorada ou simplesmente rejeitada que o Papa Pio XI produziu sua encíclica Quas Primas. Nesse sentido, Sua Santidade, sabendo muito bem o que estava sendo dito por todos os lados, declarou: “Seria um grave erro dizer que Cristo não tem qualquer autoridade em assuntos civis (…)Ele é o autor da felicidade e da prosperidade verdadeiras para cada homem e cada nação (…)Se, portanto, os governantes das nações desejam preservar sua autoridade, para promover e aumentar a prosperidade dos países, eles não irão negligenciar o dever público de reverência e obediência à regra de Cristo”.
O que nos interessa aqui é o florescimento na França do século XIX da ideia de Cristo como o Governante da Sociedade. Mais especificamente, queremos ver como é que este desabrochar encontrou expressão no pensamento, na vida e na obra de Emmanuel d’Alzon e, especialmente, nas atividades da ordem religiosa por ele fundada em 1847 (formalmente aprovada em 1864) e dirigida até sua morte em 1880, os Agostinianos da Assunção, comumente chamados de Assuncionistas. Antes de nos voltarmos para a consideração de nosso assunto, há um aspecto que deve ser mencionado. Precisamente porque a ideia de reconhecer Cristo como o Governante da Sociedade existe nas mentes de tão poucos hoje, e especialmente em nações fundadas sobre o próprio princípio do governo de acordo com a vontade do povo, em vez de Deus, muito do que segue pode parecer não somente incrível para alguns leitores, mas até inimaginável.
Como inimaginável? D’Alzon, a seguir, não está falando diretamente sobre o assunto do reinado social de Nosso Senhor, mas tente imaginar isso sendo dito pelo líder de uma ordem religiosa, ou qualquer outro clérigo notável, hoje em dia: nós amamos o Cristo com o mesmo tipo de amor que tinham os primeiros cristãos, porque Ele ainda enfrenta os mesmos inimigos que Ele enfrentou em seu tempo. Nós o amamos com o amor que fez o Apóstolo dizer: “Se alguém não ama Jesus Cristo, seja anátema” (1 Cor. 16:22). Isto pode não ser muito tolerante, mas você sabe que aqueles que amam muito, toleram pouco. Propriamente falando, o verdadeiro amor é revelado no poder de uma intolerância nobre e franca. Nestes dias, sem nenhuma energia sobrando para amar ou odiar, os homens não veem que sua tolerância é apenas outra forma de fraqueza. Nós somos intolerantes porque a nossa força provém de nosso amor por Jesus Cristo.
Isso foi quando o Pe. d’Alzon falou com os membros da sua ordem em um Capítulo Geral em 1868. Se o leitor acha inimaginável que um clérigo possa falar desta maneira hoje, ele deve se lembrar de que o Venerável d’Alzon falava em uma época não muito tempo atrás. Vamos retornar a isto mais tarde. Por agora, e de forma a desenvolver um quadro mais completo da mente do Venerável d’Alzon e também de sua ordem religiosa, vamos continuar a olhar para o seu discurso de 1868. Considerando que foi feito por ocasião do primeiro Capítulo Geral, ou reunião, dos Assuncionistas, não devemos ficar surpresos ao descobrir que ele é programático. Hoje, ele seria sem dúvida intitulado “Declaração de Metas e Diretrizes para o Funcionamento de uma Nova Comunidade Religiosa”, embora em tom e estilo esteja muito longe do sociologuês nebuloso de documentos modernos típicos com esses títulos. Claramente, essas “diretrizes” não foram escritas por um comitê.
Pe. d’Alzon começa, como deveria, indicando a finalidade da ordem. Era a vinda do reino de Deus sobre nossas almas, pela prática das virtudes cristãs e dos conselhos evangélicos de acordo com nossa vocação, e a vinda do reino de Deus no mundo por meio da luta contra Satanás e a conquista das almas resgatadas por Nosso Senhor e ainda imersas em erro e no pecado.
(Gary Potter, jornalista e autor, escreve para várias publicações católicas de liderança, com interesse especial na aplicação dos ensinamentos religiosos da igreja aos domínios políticos e sociais. http://catholicism.org/author/garypotter [entre outros]; tradução e edição de Ehusson Chequer)